Paulo Vasconcelos Jacobina.
Seguindo a tendência de uma vanguarda "científica" que representava o suprassumo do pensamento universitário e iluminado do final do século XIX, influenciado pelo "darwinismo social" e pelo "eugenismo" que era ensinado como progresso da humanidade, a Supreme Court norte-americana, no caso Buck Vs. Bell, em 1927, considerou constitucional que o Estado americano esterilizasse as pessoas de "raças inferiores" e de "mentes fracas" em nome do progresso racial da humanidade e da economia. A decisão foi relatada por ninguém menos do que o Juiz Oliver Wendell Holmes, Jr., tido como um dos maiores “Justices” que passaram pela Suprema Corte dos EUA.
Naquela época, a vanguarda do pensamento “esclarecido” era a eugenia, quer dizer, a ideia de que a humanidade teria o dever de fomentar a “melhora da espécie” usando em seu favor as técnicas “darwinistas” de seleção natural para evolução. A empolgação com o discurso cientificista, aparentemente tão coerente e fundado nas melhores razões econômicas, teve como obstáculos apenas os grupos humanistas, religiosos e conservadores, que não consideravam justo esterilizar e matar pessoas em nome da “evolução darwinista”. Mas foram rotulados, na época, de "atrapalhadores do progresso", "violadores do muro de separação entre Igreja e Estado" ou "atrasados" que querem impor sua visão "anticientífica" de mundo por cima dos iluminados cientistas, economistas e juristas. O caso “Buck vs. Bell” foi saudado na época como uma vitória do Estado laico e científico por sobre o “atraso” dos que não aceitavam aquele aviltamento do valor da pessoa humana.
Deste modo, a eugenia, e os esforços do Estado em implementá-la, foram considerados "constitucionais" lá, em votos longos e consentâneos com a “vanguarda” da época, pela utilização do Poder Judiciário como meio de ultrapassar pudores humanistas e religiosos. Mais de 60.000 pessoas foram compulsoriamente esterilizadas nos EUA em nome desta decisão tão "racional" e "econômica", baseada numa péssima leitura da teoria darwiniana, até a década de 70. Isto tudo foi feito pelo "progresso da raça" e em nome da “economia”, do “direito social” de não gastar recursos com os "feeblemindeds" e “melhorar” o ser humano.
A política eugenista legitimada por esta decisão da Suprema Corte americana continuou ocorrendo mesmo depois de 1945, quando os americanos venceram e denunciaram os nazistas por nada mais do que levar até o extremo esta mesma política. Hoje, a “eugenia” é uma teoria cientificamente ultrapassada, pelo menos nos discursos científicos do “mainstream” acadêmico – embora ativistas como a Dra. Alveda King, sobrinha de Martin Luther King, Jr., incansavelmente denuncie que as distorções da indústria abortista contemporânea atinja muito mais intensamente os bebês afroamericanos e do sexo feminino, a demonstrar que a eugenia não acabou, apenas mudou de estratégia.
É impressionante que outras "vanguardas", inclusive brasileiras, continuem confiando tanto em precedentes da Suprema Corte americana para estabelecer pura e simplesmente a moralidade de condutas desumanas, ou como “vanguarda da transformação social” em nome do "avanço social" da humanidade, contra as resistências de humanistas e religiosos. Mesmo depois que a história já demonstrou que as aparentes vanguardas científicas podem rapidamente se transformar em crueldade desumana e, logo depois, em paradigma ultrapassado.
Como serão vistas no futuro, pela ciência séria, outras condutas, como o aborto e a desconstrução da família estável e reprodutiva, aparentemente suportadas pelo consenso cientificista de hoje? Será que estas “vanguardas” tão patentemente equivocadas, tão provocadoras de dor e destruição, não serão mais uma vez denunciadas e ultrapassadas pelos próprios cientistas, como um dia o foram a frenologia e a eugenia “darwinista” do século XIX, que causaram tantas dores à humanidade? Devemos confiar nelas tanto assim, diante destes precedentes? Quiçá um dia aprenderemos: Não é porque um grupo de políticos assume um discurso cientificista e consegue uma decisão judicial em seu favor que aquilo que é bom e verdadeiro deixa de sê-lo. Toda vez que a ciência se afasta do bem e da verdade, que são os parâmetros que devem separar a ciência séria do cientificismo militante, a humanidade sofre e mais tarde. Não sem muita destruição e efeitos irremediáveis, todo “paradigma” cientificista aparentemente progressista, mas na verdade mentiroso, é desmascarado, mais tarde, pelos próprios cientistas que tenham coragem de estudá-los com honestidade.
É o caso do aborto. Independentemente do reconhecimento do valor intrínseco da vida humana, dentro e fora do útero, e da importância família biparental heterossexual estável e reprodutiva como espaço natural de geração e desenvolvimento das pessoas, já se tornam cada dia mais claras, (mesmo para quem fecha os olhos para estas realidades como valores em si mesmas), as graves consequências da liberação do aborto e da destruição da família nas culturas ocidentais contemporâneas, e suas consequências, podem ser vistas mesmo por quem disponha somente da metodologia científica séria para medi-las.
Tomemos o caso do aborto, tornado lícito nos Estados Unidos em 1973 com outra decisão da Suprema Corte de lá, na tristemente célebre decisão da legalidade do aborto no julgamento conhecido como "Roe vs. Wade". Esta decisão norte-americana foi seguida pela liberação pura e simples do aborto na grande maioria dos países europeus e no Japão. A partir de então, a liberação do aborto passou a ser vista, pelos grandes órgãos políticos mundiais como ONU, EU e similares, como indicador civilizacional de avanço social. Vê-se agora, no entanto, 40 anos depois, o mundo “civilizado” viver uma crise demográfica, previdenciária e civilizatória sem precedentes, e tem que contar, para não colapsar as respectivas economias, com maiorias reprodutivas muçulmanas, africanas e latinas, enquanto apoiado em “Roe vs. Wade”, continua matando seus filhos aos milhões nos úteros das mães. No entanto, em vez de se dar conta do equívoco, imaginam que resolverão este problema impondo o aborto e o modelo de família não reprodutiva a estas populações mais pobres.
É, portanto, no fundo, a mesma mentalidade não completamente ultrapassada da “eugenia”, como registrada no precedente "Buck vs Bell", que se visa aplicar agora nos muçulmanos e latinos, esterilizando-os à força para impedir a perda da hegemonia do norte ocidental.
A “utopia” secular do ocidente descristianizado parece envolver a progressiva liberação de drogas e a resoluta promoção do sexo não reprodutivo e do aborto, como se, para ser feliz e civilizada, a humanidade precisasse se dopar e fazer sexo inconsequente e não reprodutivo.
Por acreditar nisto, a força econômica dos países ricos e seus órgãos internacionais está compelindo sistemas judiciais e legais destas regiões mais pobres a aprovar o aborto e o matrimônio não heterossexual mesmo contra a vontade de suas populações, sob o discurso do secularismo e do cientificismo. O discurso tem cores de uma ecologia malthusiana que proclama os perigos de uma “superpopulação” exatamente no momento em que a humanidade parou de crescer populacionalmente, e na qual a grande ameaça ao meio ambiente vem da ambição econômica e industrial ilimitada, ou seja, do consumismo e do desenvolvimentismo, e não do respeito aos embriões, às famílias e às religiões e culturas.
Algumas dessas políticas independem de coloração partidária, como as que dizem respeito à diluição do conceito de família e à progressiva liberação das drogas e implantação do aborto. Elas parecem estar na pauta não somente do atual governo brasileiro, mas de todos os governos do mundo e ao mesmo tempo, o que afasta a possibilidade de mera coincidência: isto sinaliza que elas não decorrem de consensos locais, mas de imposição internacional, e delas não fugirão os eventuais candidatos a presidente, a senadores e deputados, por aqui, de esquerda ou de direita. Países governados pela “direita”, bem como países governados pela “esquerda”, estão sendo conduzidos pelos seus respectivos governos nesta direção, resoluta e inexoravelmente, mesmo contra todas as resistências sociais locais. É hora de exigir dos nossos candidatos locais clareza quanto a estes tópicos, para que não elejamos exatamente os nossos futuros adversários.
Diácono Valney